Breve Reflexão Sobre a Medicina Segundo a Perspectiva de Foucault


A medicina urbana desenvolvida na França – já existindo uma medicina de estado na Alemanha – surge na tentativa de erradicar, se não ao menos de aliviar, sobretudo, os problemas sanitários por meio de vigilância exaustiva de doentes e controle da insalubridade das ruas. Esta medida adotada tinha, porém, no fundo, como objetivo, não o bem-estar geral da população em uma perspectiva impessoal sem tomar partido de uma concepção particular de saúde, mas tinha intenção de solucionar os problemas de força de trabalho e a vulnerabilidade patológica da classe burguesa que ficará claro com a medicina social desenvolvida na Inglaterra.

Na Inglaterra a medicina praticada ganha o caráter exigido pelo avanço do capitalismo. O pobre já não era visto tão somente como um fragmento da paisagem poluída da cidade, mas como um verdadeiro vetor de doenças. Além disso, as nascentes indústrias passavam cada vez mais a necessitar de mão-de-obra ativa entre a população, isto incluía não só idade e sexo para o tipo de trabalho, mas disposições fisiológicas para o exercício. Assim, toma-se lugar a vacinação, as vistorias clínicas e o monitoramento geral da saúde pública controlando efetivamente o corpo das classes mais pobres e tendo como objetivo em primeiro plano, contudo em oculto, o controle e vigilância político-moral-mediativa das classes marginalizadas.

O processo histórico do desenvolvimento da medicina que acabo de esboçar, segundo a sugestão de Foucault, projeta nos dias atuais seus princípios de controle e vigilância das classes abastadas, sobretudo sua idéia de saúde. É possível – e relativamente fácil - colocar em paralelo as exigências do modelo de produção capitalista de ontem e de hoje com o comportamento cotidiano relacionado à saúde em nossos dias. A extrema preocupação com o peso, hábitos narcóticos e comportamento sexual evidenciam as ressonâncias entre a indústria e o que ela exige como mão-de-obra. A reprodução excessiva de uma ética da saúde construída pelos instrumentos do poder econômico ditam os costumes que devem ser valorizados (dietas, anti-tabagismo, e etc) segundo a relação indivíduo-mão-de-obra-indústria. Essa publicidade exaustiva de injeção de valores – como é possível perceber nas campanhas televisivas de anti-tabagismo, por exemplo - busca não só a consolidação de um conceito fixo de saúde pelo conjunto estado-economia, mas, também, faz parte da consolidação geral da doutrina moral desejada pela soberania econômica. Desta forma, por meio de uma subjetividade tendenciosa sobre o que é saúde, a medicina de nossos dias, assim como outros aparatos de dominação ideológica do poder, pertence, necessariamente, ao conjunto de fatores da sociedade que perpetuam e ditam as verdades subjugadas ao progresso capitalista.

- Benny

Comentários

Pinecone Stew disse…
Excellent article, Benny.

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